Nayara Alves Pereira
O empresário diante da crise possui duas alternativas, sendo ela o pedido de recuperação judicial ou a decretação de falência.
quarta-feira, 29 de agosto de 2018
O Brasil atravessou e ainda atravessa acentuado período de crise econômica o que levou os empresários a buscar caminhos para suportar e superar os percalços apresentados.
Consequentemente, a crise trouxe para a mídia diversas publicações de empresas que ingressaram com pedido de recuperação judicial, como foi o caso da OI Telefonia Móvel e, recentemente, a Editora Abril, gerando discussões a respeito da efetividade do instituto.
Dados de julho da Boa Vista SCPC apontam que o pedido de recuperação judicial aumentou 21,2% no primeiro semestre de 2018 em comparação com o mesmo período do ano passado.
Ressalta-se que 92% dos pedidos de recuperação judicial são originários de empresas de pequeno porte, justamente aquelas que possuem importância vital para todo o ciclo econômico, vez que geram mais empregos, rendas e estão, na maioria dos casos envolvidas na vida de pequenas comunidades.
E, não seria para menos, uma vez que a recuperação judicial é um meio da sociedade empresária reorganizar seu passivo, mantendo sua atividade comercial e, embora haja uma fiscalização do judiciário, os empresários não perdem o seu poder de gerência. Assim, com o deferimento da recuperação judicial, a sociedade empresária mantém sua atividade principal, bem como seu quadro de funcionários, garantindo maior segurança ao empresário e aos funcionários dele dependente, possuindo como fim precípuo a manutenção da função social da empresa e o interesse dos credores.
O empresário diante da crise possui duas alternativas, sendo ela o pedido de recuperação judicial ou a decretação de falência.
Desta forma, embora a recuperação judicial possa parecer um "remédio amargo" em uma primeira análise, é ela que poderá garantir a superação da crise sem que o empresário seja colocado de lado para que um terceiro assuma.
Neste cenário, encontraremos a figura do administrador judicial que será nomeado após o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial.
O administrador judicial é um terceiro nomeado pelo juízo que, fugindo da hermenêutica da palavra, não irá administrar a sociedade, mas sim fiscalizá-la para o magistrado e os credores, intermediando a relação e prestando as informações necessárias dentro dos autos. Pode-se dizer então que o Administrador possui semelhança a um fiscal, encarregado de acompanhar e fiscalizar o processo de recuperação judicial e o comportamento da empresa em recuperação e daqueles que a dirigem, logo ele é um auxiliar qualificado do juízo.
Pois bem. Nomeado o administrador judicial e iniciado os procedimentos da recuperação judicial, a sociedade recuperanda terá prazo para apresentar o chamado plano de recuperação judicial, onde nele estabelecerá a forma de pagamento, os deságios, as carências, o número de parcelas, qualificará as classes de credores, dentre outras especificidades.
Resumidamente, para que um plano seja aprovado ele deverá conter:
Assim apresentado o plano de recuperação judicial, havendo objeção de qualquer credor, este será submetido à assembleia geral de credores, onde, com o quórum mínimo estabelecido em lei, será discutido e aprovado (artigo 56 da lei 11.101/05). Frisa-se que poderá ocorrer mais de uma sessão para discussão do plano, podendo ser realizadas adaptações até que este seja efetivamente aprovado.
Importante, apenas destacar, que embora a assembleia possua autonomia, não podendo o juiz interferir no conteúdo do plano efetivamente aprovado, há uma hipótese em que o plano aprovado em uma classe ou duas classes e não aprovado em outra, poderá sofrer homologação forçada, desde que cumprido os requisitos do artigo 59 da lei 11.101/05.
Com a aprovação do plano, a recuperanda iniciará os trabalhos de gestão empresarial para cumpri-lo, permanecendo sob o crivo do administrador judicial por pelo menos dois anos, oportunidade em que, cumprida as obrigações que se venceram neste interregno o juiz declarará extinta a recuperação.
O fato do processo de recuperação judicial ser extinto após dois anos da homologação do plano não impede que este preveja pagamentos superiores a tal período. O plano poderá ser formulado de acordo com a realidade do devedor, mas será submetido a todos os devedores que terão conhecimento prévio e poderão opinar/aprovar quando da realização da assembleia.
Assim, extinta a recuperação judicial após dois anos, o devedor continuará cumprindo o plano, mas sem a presença do "fiscal" do judiciário e sem o risco de decretação imediata de falência.
O instituto da recuperação judicial ao mesmo tempo que causa curiosidade, provoca receios e inseguranças. Isso porque, o empresário deverá abrir sua vida (profissional) para todos os seus credores, demonstrando o passivo acumulado e a dificuldade momentânea em cumpri-la, passará a ter um terceiro fiscalizando suas atividades e a obrigação de prestar contas periodicamente em juízo.
Contudo, a recuperação judicial traz de imediato, logo após o seu deferimento a oportunidade de o empresário recuperar seu fôlego, vez que entrará no chamado stay period, que é um período de 180 dias em que toda execução contra a sociedade ficará suspensa, sem movimentação, impedindo que ocorra expropriação de bens essenciais à empresa. Além disso, outro grande benefício do instituto é o fato do devedor poder negociar deságios, carências e parcelamentos com todos os credores igualmente, situação esta que não seria possível sem o ordenamento.
Registra-se que a natureza fundamental para o salvamento de um negócio é econômica-administrativa-financeira, somente sendo necessária a atuação jurídica quando esta ocorrer perante o judiciário. Assim, a lei 11.101/05 permiti que aquele negócio economicamente viável possa ser efetivamente recuperado, mas para tanto deve ser bem gerido, possuir credibilidade perante os credores e o mercado de uma forma geral.
Caros Leitores, como observado no presente texto embora complexo, o instrumento da recuperação judicial é uma medida que se bem executada permitirá que o empresário continue com a sua atividade, gerando emprego, movimentando a economia local e, obviamente, obtendo lucro.
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*Nayara Alves Pereira é sócia do escritório Chalfun Advogados Associados.
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